Estabelecer nossa direção de luta e avançar às conquistas definitivas

Uma reflexão sobre os movimentos reivindicatórios em Friburgo, no Brasil e no mundo.

No último dia 12, feriado, uma série de manifestações foram realizadas nas principais cidades brasileiras. Seu objetivo: denunciar a corrupção nas esferas de poder. Diante da repercussão (foi, estranhamente divulgado em todos os telejornais, capa nos principais impressos e é certo que figurará nas próximas revistas semanais), virei-me imediatamente para a História. Algo não cheirava bem ou, quem sabe, cheirava a perfume francês.

Impossível não se lembrar da Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em 1964, com seu considerável serviço ao Regime Militar que, mais tarde, se instalaria no país. Impossível, também, deixar passar o Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros, o popular “Cansei”, deflagrado em meados de 2007, que combateria uma possível desordem administrativa do governo Lula. Descaradamente elitista, o movimento declarava-se, antes de tudo, apartidário. E esse é o ponto.

Nova Friburgo passou, a partir de janeiro de 2011, de cidade capital da moda íntima e grande produtor de flores, para palco de uma das maiores tragédias climáticas do Brasil. Centenas de mortos, áreas completamente devastadas e um sem número de desabrigados que, ainda hoje, “vivem” em abrigos improvisados nos cantos da cidade. Para exemplificar, basta que se visite o antigo SASE, no bairro de Olaria, uma unidade de saúde que deu lugar a inúmeras famílias que perderam todos os seus bens e dignidade.

A ameaça de nova tragédia é real e provável diante da morosidade dos poderes. Nenhuma ação efetiva, fora da área visível do centro da cidade, é concretizada. Somam-se a isso as já incontáveis denúncias de favorecimento de empreiteiras, desvio de verbas e favorecimento de empresas na execução dos serviços.

No sábado último, dia 15/11, um temporal no final da tarde alagou inúmeras ruas no centro da cidade. Apesar de nenhuma ocorrência mais grave ter sido verificada (ou divulgada), o rápido alagamento trouxe alguns prejuízos aos comerciantes e, acima de tudo, trouxe o medo e a apreensão de volta.

Após a tragédia de janeiro, formou-se na cidade o Fórum Sindical e Popular, aglutinando diversos setores da sociedade civil organizada, como sindicatos, partidos políticos de esquerda, organizações culturais etc. Essa movimentação já ocasionou uma série de protestos tanto no centro quanto nos bairros mais afastados e prejudicados com os desabamentos. No domingo (dia 16/11), no entanto - talvez em função do desespero causado pela chuva e a lembrança da tragédia -, formou-se mais um grupo que reivindica ação do poder público. O grupo - batizado “Eu Luto!” – organizou, através da Internet, a ideia de uma mobilização maciça da população em frente à Câmara de Vereadores da cidade, em 18/11, através de uma vigília sem hora para cessar.

Seria louvável que o movimento conseguisse conscientizar os friburguenses em torno de um apelo comum, mas, estranhamente, alguns membros declararam o movimento apartidário, desvinculando-o de qualquer grupo, sindicato e, principalmente, de partidos políticos. Alguns membros recusaram a solidariedade dos partidos de esquerda da cidade, afirmando que iriam “bandeirar” o movimento. Dirigiram a crítica de forma generalizada aos partidos, colocando no mesmo saco todo e qualquer político, como se todos fossem corruptos ou oportunistas. A análise superficial e do senso comum revela uma faceta característica dos movimentos recentes.

A conjuntura política atual desfavorece a ação do “partido proletário”. Os inúmeros escândalos envolvendo políticos desfiguram as ações daqueles que, mesmo lutado há décadas, são considerados políticos, da forma mais pejorativa, caçadores incansáveis de votos em busca de poder fácil e da perpetuação no poder. A negativa de apoio por parte do movimento recém-criado deixa nas entrelinhas o seu verdadeiro alvo: se, por um lado, o objetivo é cobrar efetivas mudanças no que se refere à reconstrução da cidade, por outro, não há menção à necessidade da realização de mudanças efetivas no modo de vida atual, da superação do capitalismo excludente e criminoso, da obrigação de uma revolução moral e cultural, da militância imprescindível e permanente em todas as frentes políticas e sociais. Ao negar que os partidos comprometidos com essas causas se apresentem como mais um instrumento de luta, corrompem a democracia, igualam-se aos ditadores e censores da década de 60/70, fazem coro à politicagem mesquinha e suja surgida a cada dois anos.

Ao negarem, por fim, que qualquer movimento já organizado acampe no embate, enfraquecem nossa luta comum, fragmentam as ações e se aproximam de um fracasso desinteressante para todos.

O movimento do dia 18/10 conseguiu entregar carta de reivindicações ao chefe do legislativo. De uma forma estranha, no entanto, uma de suas lideranças conclamou que os manifestantes deixassem o prédio, fato que foi negado até certo ponto por alguns participantes. No fim, todos foram embora com a promessa de voltar em 15 dias, acreditando que basta entregar um memorando aos senhores vereadores, os quais, em sua maioria e com reconhecidas exceções, pouco se importaram em sugerir e/ou lutar por soluções para os graves problemas causados pela tragédia há nove meses.

O movimento se declara vencedor, mas não faz a autocrítica necessária, no sentido de que seja garantida a contínua mobilização. Como está, a carta não acarretará em melhoras significativas aos moradores das periferias. É a ilusão política dos “apartidários” que, na confusão, se declararam suprapartidários, demonstrando, no mínimo, incoerência política e, talvez, ingenuidade com as promessas vindas de cima. É preciso ainda questionar o “apartidarismo” do movimento, já que, no dia da “manifestação” na Câmara Municipal, havia vários candidatos a vereador (mais do que conhecidos. Estariam “infiltrados”?) entre os manifestantes.

O Fórum Sindical e Popular continuará mobilizado, indo aos bairros, ouvindo não só internautas, mas a população dos lugares mais afastados e mais atingidos. Iremos às portas de fábricas, para mobilizar os principais interessados nas soluções dos problemas nos bairros: os trabalhadores, que constroem efetivamente a riqueza dessa cidade. As reuniões do Fórum continuam abertas e democráticas, podendo qualquer entidade, movimento, partido ou organização aderir ao debate de ideias.

O apelo à necessidade da unidade na luta é imperativo! Conscientizar, debater, convencer e ser convencido faz parte do jogo político inerente ao ser humano. Se isso é limado por qualquer liderança envolvida, não efetivaremos nossos desejos, nossas causas, nossas ambições. Assim, faremos o protesto que a elite gosta: aquele que não incomoda e é esquecido em poucas horas.

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